quarta-feira, 17 de julho de 2013

Palestina contemporânea em três filmes

Este post é bem simples. Quero compartilhar com vocês a indicação de três filmes que assisti recentemente e que considero interessantes para conhecer e pensar as questões políticas ligadas ao conflito Palestina-Israel a partir do século 20; sobretudo para serem trabalhadas em sala de aula. Obviamente, isso deve ser feito através dos aparatos técnicos e teóricos de cada disciplina para estabelecer a crítica fílmica. No texto que se segue não farei uma análise das três obras cinematográficas, apenas uma apresentação dos enredos e algumas questões que podem ser suscitadas por cada um deles. Feito isso, compartilharei links para baixá-los via torrent.

[1º] Ocupação 101: a voz silenciada da maioria (Occupation 101)

“O maior inimigo do conhecimento não é a ignorância... é a ilusão do conhecimento”. É com esta frase do físico Stephen Hawking que este documentário produzido em 2006 nos Estados Unidos se inicia. O filme procura fazer uma abordagem histórica do conflito no território a partir do sionismo do final do século 19, que seria então uma forma de resposta ao repúdio que os judeus sofriam em toda a Europa antes mesmo do Holocausto. Defendendo a ideia de que o lugar era densamente ocupado por palestinos e não se tratava de uma terra devoluta, como algumas posições antipalestinas advogam, a obra almeja demonstrar que havia um acordo após a Segunda Guerra Mundial para a constituição de dois Estados: um israelense e outro palestino. No entanto, embora a população fosse majoritariamente palestina, o projeto fronteiriço recortava uma parte maior destinada à criação do Estado de Israel que, por sua vez, obteve também o solo mais produtivo.

A isto se seguiu uma ocupação forçada das cidades tidas como dentro do território israelense. Pessoas foram retiradas de suas casas através da violência do aparato bélico de Israel. É a partir daí que começarão os conflitos que assistimos hoje entre israelenses e palestinos, entre judeus e árabes, naquela terra. E não como a visão hegemônica costuma entender, dizendo que sempre existiu essa “guerra” ou que ela dura mais de dois mil anos. Por meio de entrevistas com intelectuais (como Noam Chomsky) e de depoimentos de testemunhas, o documentário afirma que, antes da ocupação forçada, árabes e judeus conviviam pacificamente na Palestina. Outra questão interessante alçada pela obra refere-se aos lobbies políticos que os judeus possuem com o governo dos EUA, financiando campanhas eleitorais e se beneficiando do acordo entre empresas judias e políticos estadunidenses. Aspecto este retratado também numa recente série de sucesso na terra do Tio Sam, chamada House of Cards.

Não encontrei o trailer do filme com legendas em português, por isso deixarei abaixo um trecho do filme legendado. Nesta cena se destaca as crianças como personagens do conflito e a maneira como este as afeta psicológica e fisicamente.
 
Link para baixar o filme completo via torrent: clique aqui!

Outra possibilidade é assistir o filme através do YouTube. Porém, ele se encontra fragmentado em nove partes. Segue aqui a primeira:

[2º] Cinco câmeras quebradas (Five broken câmeras, 2011)

Este documentário singular, em todos os sentidos, foi gravado por um camponês palestino, Emad Burnat, em 2005, ano em que houve a construção de um muro (como tantos outros) numa cidade na região da Cisjordânia com a justificativa de proteção, porém com o intuito de ocupação de terras palestinas pelos colonos judeus. A produção que concorreu ao Oscar 2013, como melhor documentário estrangeiro, narra e vivencia o cotidiano dos diversos conflitos, imposições e resistências na cidade de Bil’in. As cinco câmeras quebradas as quais o título do filme se refere são os aparelhos de filmagem utilizados por Emad e que são destruídos pelas mãos ou por balas dos soldados israelenses durante os conflitos que ele gravou. O que me chamou atenção na obra foi a ligação da família palestina com o Brasil, afora as crianças vestidas com uniforme da seleção brasileira de futebol, há também bandeiras do Brasil na porta da casa de Emad e em uma de suas câmeras. No filme diz que durante algum tempo, sua esposa, Soraya, morou no Brasil. Outro fato curioso, externo à produção em si, foi a breve detenção de Emad e de sua família no aeroporto estadunidense quando aportaram em Los Angeles para a festa de premiação do Oscar deste ano. Michael Moore foi quem mediou a liberação de Emad. “Parece que eles não conseguiam entender como um palestino podia ter sido indicado ao Oscar”, afirmou Moore. Vejam a notícia completa e uma apresentação mais detalhada do filme no Brasil de Fato.

Trailer do filme com legendas em inglês (não achei em português):



Link para baixar o filme completo via torrent: clique aqui!

Cabe aqui também apresentar as importantes intervenções feitas pelo um grupo anarquista, formado por israelenses, conhecido como “Anarquistas Contra o Muro”. Esta organização luta em favor da derrubada dos muros em construção ou já construídos pelo governo israelense, pois entendem que estes são dispositivos de um Apartheid que cerceia a liberdade dos palestinos. Para saberem mais deixo alguns links:

Site da organização (em inglês).
Apresentação do grupo pelo Wikipedia.

[3º] O limoeiro (Lemon Tree, 2008)

Dirigido pelo israelense Eran Riklin, O limoeiro, diferentemente dos outros dois filmes mencionados, não se trata de um documentário, mas de uma narrativa representada por atores profissionais, baseada em acontecimentos reais. Sem dúvida é um dos filmes mais doces e singelos que já assisti. A trama se inicia quando o Ministro da Defesa israelense muda-se para a fronteira entre Israel e Cisjordânia (o lado oeste do rio Jordão). Sua vizinha Salma Zidane é uma viúva palestina que mora sozinha e possui uma humilde plantação de limão, da qual retira sua renda. Os governantes israelenses então entendem que a plantação representa um perigo a suas integridades, alegando que ela poderia ser usada como esconderijo para ataques terroristas. E decidem através da lei destruir as árvores da sra. Zidane. Daí segue-se um longo litígio que repercute internacionalmente. O interessante no filme é perceber como questões macro-políticas interferem de maneira direta na vida cotidiana das pessoas comuns. A posição delicada de uma mulher viúva na cultura islâmica também é colocada em xeque na medida em que a personagem principal relaciona-se com seu advogado e sofre repúdios de membros de sua comunidade, para os quais a figura do marido falecido deve ser sempre respeitada.

Trailer do filme em espanhol (não encontrei com legendas em português):

Link para baixar o filme completo via torrent: clique aqui!

Espero que gostem!
 
Referências:

ABRÃO, Baby Siqueira. A palestina vai ao Oscar. E é detida no aeroporto. In: Brasil de Fato: uma visão popular do Brasil e do mundo. São Paulo, 21 fev. 2013.
CINCO Câmeras Quebradas (5 Broken Cameras). Direção: Emad Burnat & Guy Davidi. Gênero: Documentário. País: Palestina/Israel/França/Holanda. 2011. DVD, colorido, 94min.
LIMOEIRO, o. (Lemon Tree – Etz Limon). Direção: Eran Riklis. Roteiro: Eran Riklis e Suha Arraf. Gênero: Drama. País: Israel/França/Alemanha. 2008. DVD, colorido, 106min.
OCUPAÇÃO 101: a voz da maioria silenciada (Occupation 101: Voice of the Silenced Majority). Direção e produção: Sufyan Omeish & Abdallah Omeish. Gênero: Documentário. País: Estados Unidos. 2006. DVD, colorido, 90min.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Anarquismo e cooperação em Kropotkin

O texto que se segue é uma continuidade de “Naturalmente anarquista: uma iniciação ao pensamento de Proudhon” e compõe a segunda parte de um artigo que publiquei na revista eletrônica Ágora de Cerro Grande (RG). O anarquista russo Piotr Kropotkin, além de filósofo, foi geógrafo e etnólogo. Notadamente inspirado pelo positivismo científico de sua época, além de escrever diversos textos panfletários, também produziu obras teóricas importantes e apresentou conferências e palestras sobre literatura russa. Em vida, sua produção escrita sobre anarquismo se estendeu de meados da década de 1870 até sua morte em 1921.

As ideias políticas de Kropotkin possuem algumas diferenças às de Proudhon. Enquanto o último é defensor da posse individual sobre os meios de produção e da transação comercial como comunicação entre os homens, trocando um produto por outro de valor igual, o primeiro acredita que no ideal final da sociedade anarquista deverá haver uma livre distribuição dos produtos de consumo e a abolição de qualquer tipo de propriedade ou de posse sobre os meios de produção.[1] O russo afirma que a anarquia é, portanto, sinônima de comunismo. Mas não significa que seja um comunismo autoritário e centralista que pretende tomar o Estado e instaurar um suposto governo revolucionário até a dissolução completa das classes sociais.[2] A completa supressão do Estado e de qualquer tipo de governo político representativo se dará assim que a revolução, como necessidade histórica de transformação social, estiver concluída.

Entretanto, assim como Proudhon, Kropotkin acredita que a sociedade procura naturalmente ou instintivamente a ordem social na anarquia, que significa ausência de coerção e de autoridade externa, como também expressão da presença de solidariedade e de cooperação entre os membros do coletivo. Para o autor, a anarquia não é somente um princípio filosófico, mas também a visão dinâmica e completa dos fatos sociais do processo histórico da humanidade, que exprimem as verdadeiras causas de seu progresso. Sobre sua compreensão da anarquia, ele diz o seguinte:

“A ideia anarquista teve de combater todos os preconceitos sociais, impregnar-se a fundo de todos os conhecimentos humanos a fim de poder demonstrar que suas concepções condiziam com a natureza fisiológica e psicológica do homem, e observavam as leis naturais, enquanto a organização atual estava estabelecida contra toda lógica, o que faz com que nossas sociedade sejam instáveis, transtornadas por revoluções que são, elas próprias, ocasionadas pelos ódios acumulados daqueles que são esmigalhados por instituições arbitrárias” (KROPOTKIN, 2007, p. 70).

Assim, a busca da sociedade anarquista seria, como para Proudhon, a assistência às necessidades naturais dos seres humanos que são integrados num organismo social ordenado. Todavia, apesar de estável, a sociedade no anarquismo não seria imutável, pelo contrário, sua flexibilidade, reajustamento e mudança atenderiam o equilíbrio de múltiplas forças e influências conforme o conjunto da vida orgânica, de maneira natural, sem que nenhuma dessas forças atuantes recebesse a proteção do poder estatal (KROPOTKIN, 1987, p. 20). Essa proposição é bastante importante para o autor, pois ela é básica para assegurar que no anarquismo-comunista haverá o pleno desenvolvimento da individualidade de todos, tendo em vista que é pelo grau de sociabilidade e pela exiguidade de intervenção coercitiva que o indivíduo demonstra plenamente suas qualidades.

A espontaneidade individual que luta contra o autoritarismo em favor de sua completa libertação é descrita desde os primeiros relatos da História humana. Kropotkin adverte que todas as revoltas na antiguidade e no medievo expressam a luta histórica pela anarquia (1987, p. 23). Mas nem só de revolta vive o princípio histórico do anarquismo. O primeiro momento é sim de negação e de força contra o autoritarismo, porém existe determinado aspecto ligado à afirmação da vida e à sobrevivência social que constitui também um exercício do anarquismo-comunista: o instinto natural de ajuda mútua entre os seres vivos.

Para dar conta da compreensão desse princípio básico de comunidade e da tentativa de comprová-lo empiricamente, Kropotkin escreveu, em 1902, uma obra teórica bastante interessante (Ajuda mútua: um fator de evolução) onde o autor passa a observar o comportamento das espécies animais desde os menores seres vivos até os homens nas sociedades primitivas, medievais e modernas. O russo vai contra as teses dos darwinistas que afirmavam que a competição é o principal fator de evolução das espécies e, por tabela, contra Hobbes que (segundo sua leitura) defendeu a necessidade do contrato social instaurador do Estado baseado na justificativa da natureza iminentemente perversa do homem em sociedade.[3] De acordo com o anarquista, o fator determinante para a manutenção das espécies e também da vida em comunidade é a cooperação. Neste sentido, ele lutará contra as teses que defendiam a natureza competitiva do homem:

“[...] quando as relações entre o darwinismo e a sociologia me chamaram a atenção, não pude concordar com nenhuma das obras e panfletos escritos sobre esse tema tão importante. Todos eles tentavam provas que os seres humanos, devido à superioridade de sua inteligência e de seus conhecimentos, podiam mitigar entre si a dureza da luta pela vida. Mas, ao mesmo tempo, todos eles concordavam que a luta pelos meios de subsistência, a luta de todo animal contra seus semelhantes, e de cada ser humano contra todos os outros, era uma “lei da Natureza”. Eu não podia aceitar esse ponto de visa, porque estava convencido de que admitir uma implacável guerra interna pela vida no seio de cada espécie – e ver nessa guerra uma condição de progresso – era admitir algo que não só não havia sido provado, como também não fora confirmado pela observação direta” (KROPOTKIN, 2009, p. 12, grifos do autor).

Enquanto para Proudhon o sentimento humano de simpatia e de equidade é gerado pela sociabilidade, ou seja, é algo cultural quando lhe é espontaneamente apresentado às condições de seu desenvolvimento cognitivo através da anarquia, para Kropotkin a solidariedade e a cooperação é da natureza do homem em favor de sua própria sobrevivência, independentemente das condições sociais.

Em torno deste enunciado, Kropotkin, em vez de construir um estado de natureza hipotético do homem, empreendeu a observação e a descrição do comportamento de “sociedades tribais” para demonstrar a cooperação nas formas sociais conhecidas como primitivas para os pesquisadores da época. Em diversos pontos do globo terrestre são conhecidos povos (como os bosquímanos e os hotentotes africanos, os esquimós e os aleutas nas regiões de frio intenso, os papuas na Indonésia e os daiaques na Oceania) que mesmo numa vida rudimentar buscaram a sobrevivência no apoio mútuo. Inclusive era raro nessas sociedades, segundo Kropotkin, existir uma chefia suprema ou haver a constituição de um corpo estrutural que se parecesse com nosso Estado. Geralmente, quando existiam, as lideranças apenas expressavam os costumes dos membros do grupo. Contudo, o interesse do autor em fazer este estudo não foi para dizer de onde partimos e para onde devemos voltar, mas para mostrar que a cooperação é o fator de evolução que manteve os diferentes grupos humanos vivos durante tanto tempo.[4] Assim, ele descreverá igualmente nas sociedades modernas o mesmo fator evolutivo.

Para Kropotkin, não há, absolutamente, nenhum instinto que desencadeia batalhas sangrentas entre os membros de uma determinada comunidade. As guerras são concatenadas pelos líderes políticos e intelectuais que manipulam os participantes dos exércitos, enquanto o povo não toma parte em nada. Aliás, diante das desgraças em batalhas históricas, muitas pessoas, como enfermeiros e cidadãos comuns, ajudaram os chamados “inimigos de sua nação”, socorrendo-os, sem fazer distinção entre um e outro (KROPOTKIN, 2009, p. 7). O autor não acredita que estes fatos sejam a generosidade cultural humana, diante do infortúnio dos outros, porém o instinto de sobrevivência da espécie em atuação:

“Não é o amor por meu vizinho – que muitas vezes nem conheço – que me induz a pegar um balde de água e correr em direção a sua casa quando vejo pegando fogo; é um sentimento ou instinto muito mais amplo de solidariedade humana que me mobiliza. O mesmo acontece com os animais. Não é o amor, nem mesmo simpatia (compreendida em seu sentido literal), o que leva um rebanho de ruminantes ou de cavalos a fazer um círculo a fim de resistir ao ataque dos lobos; ou lobos a formar uma alcateia para caçar; ou gatinhos ou cordeiros a brincar; ou os filhotes de uma dezena de espécies de aves a passarem os dias juntos no outono. [...] É um sentimento infinitamente mais amplo que o amor ou a simpatia pessoal – é um instinto que vem se desenvolvendo lentamente entre os animais e entre seres humanos no decorrer de uma evolução extremamente longa e que ensinou a força que podem adquirir com a prática da ajuda e do apoio mútuos, bem como os prazeres que lhe são possibilitados pela vida social” (KROPOTKIN, 2009, p. 14; grifos nossos).

É importante salientar que comumente diversos autores e historiadores do anarquismo buscaram o germe da anarquia nas filosofias, nas revoltas e nos movimentos sociais mais antigos ao longo de todo curso da História humana escrita.[5] Contudo, da maneira empreendida por Kropotkin nenhum outro autor o fez tão bem, pois o russo não se reduziu a pensar o comportamento humano em sua cultura social, mas procurou comprovar cientificamente, ao seu modo, como o princípio da anarquia e da cooperação está presente na natureza de todos os animais e tem atuado por toda a história no convívio com os mesmos de sua espécie. Desta maneira, o comunismo anarquista de Kropotkin, não é uma proposta política inovadora que pretende manipular metodicamente as estruturas da organização societária, porém é somente a adequação à natureza humana e social. Em última instância, é a defesa de uma sociedade que formará agrupamentos espontâneos de baixo para cima de acordo com seus hábitos sociais e naturais, agora intrínsecos.

Pitacos safados!

Obviamente, é necessário considerar que os postulados de Proudhon e de Kropotkin são produtos de um discurso ideologicamente conduzido em favor de suas bandeiras políticas. Entretanto, qual discurso não é ideológico? Foucault (2010) afirma que todos o são, até mesmo, e inclusive, os científicos e historiográficos. A importância das proposições expostas por estes dois pensadores está justamente no desafio de pensarmos o quanto algumas verdades “prontas” nos chegaram e, de certa maneira, se encontram atualmente cristalizadas e inquestionáveis. Um exemplo: nas escolas brasileiras, as teses darwinistas sobre a competição inerente ao progresso humano e animal são apresentadas como comprovadas empiricamente acima de qualquer objeção, não havendo questionamento ou abertura para o debate divergente. Kropotkin e outros cientistas contrários a estas ideias são esquecidos. Do mesmo modo, a constituição do Estado moderno é narrada diversas vezes através de uma verdade que se apoia numa justificativa supostamente indubitável (“o homem é lobo do homem”). Neste sentido, podemos pensar em que medida estes discursos representam interesses ideológicos e políticos, independentemente de serem verdadeiros ou falsos. Quanto eles foram historicamente uteis para assegurar uma determinada verdade histórica?

Texto publicado originalmente em:
ALVES, M. P. Natureza e anarquia: aspectos entre natureza e história na filosofia política anarquista de Proudhon e Kropotkin. Ágora Revista Eletrônica. Ano VIII, n. 16, p. 31-42.

Referências:
FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.
KROPOTKIN, P. A ajuda mútua: um fator de evolução. São Sebastião: A Senhora Editora, 2009.
KROPOTKIN, P. A conquista do pão. Rio de Janeiro: Edição da Organização Simões, 1953.
KROPOTKIN, P. O princípio anarquista e outros ensaios. São Paulo: Hedra, 2007.
KROPOTKIN, P. Palavras de um revoltado. São Paulo: Imaginário, 2005.
NETTLAU, M. História da anarquia: das origens ao anarco-comunismo. São Paulo: Hedra, 2008.

[1] A máxima “de cada um segundo suas capacidades e a cada um segundo suas necessidades” criada pelos socialistas, entre o final do século 18 e início do século 19, recebeu a crítica de Proudhon, que entendia que comunidade não sabia o quanto cada indivíduo poderia trabalhar e consumir, sendo impossível uma lei ou uma autoridade (individual ou coletiva) neutra que fosse justa. Por outro lado, Kropotkin retoma e defende essa máxima, acreditando que o próprio indivíduo terá consciência e responsabilidade sobre o quanto pode trabalhar para a sociedade libertária e o quanto necessita consumir.
[2] Respondendo aos comunistas marxistas, Kropotkin diz que o governo revolucionário é um contrassenso, pois todos os governos, sejam de um indivíduo ou de um grupo são despóticos e autoritários, não combinam com revolução, no máximo querem fazer um remendo da concepção burguesa de sociedade. Assim que toma o poder político o grupo ou o partido deixa de ser revolucionário para ser reacionário e conter através da força tudo aquilo que vai contra seus interesses particulares (KROPOTKIN, 2005, p. 185-188).
[3] Kropotkin condena as visões pessimistas da humanidade, as caracterizando como superficiais e insuficientes. O autor escreve o seguinte: “Essa foi a posição adotada por Hobbes. Embora alguns de seus seguidores do século 18 tenha se empenhado em provar que, em nenhuma época de sua existência – nem mesmo na mais primitiva –, a humanidade viveu num estado de guerra perpétua, que os seres humanos foram sociáveis mesmo no ‘estado de natureza’ e que foi a falta de conhecimento, e não a má índole natural humana, a  responsável por levá-los a todos os horrores da história [...]. Mas a filosofia hobbesiana ainda tem muitos admiradores; e ultimamente surgiu uma tendência que, adotando a terminologia de Darwin, e não suas ideias principais, construiu um argumento em favor da visão de Hobbes sobre o homem primitivo e conseguiu até mesmo dar-lhe uma aparência científica” (KROPOTKIN, 2009, p. 73). O autor se dirige especificamente a Thomas Henry Huxley e também a Herbert Spencer, defensores de uma tendência chamada de “darwinismo social”.
[4] Pois apesar do surgimento no século 20 de uma determinada vertente primitivista no anarquismo, que ataca a civilização moderna e prega a volta às “origens”, a proposta de Kropotkin não é essa. Muito pelo contrário, em outros escritos ele diz que a observação das chamadas sociedades “selvagens” era apenas para mostrar o apoio mútuo em diversos âmbitos de organização social. O russo defende que “o homem não é um ser que possa viver exclusivamente para comer, beber e procurar abrigo”. Então, assim que tiver conseguido realizar essas necessidades sua vida buscará a sofisticação e o luxo. A busca pela revolução social é em primeiro lugar para assegurar o pão a todos, contudo, não sendo mais explorado no trabalho e tendo o pão assegurado, o homem disponibilizará de tempo necessário para promover seus dotes artísticos, suas capacidades intelectuais e científicas (KROPOTKIN, 1953, p. 44-46).
[5] Max Nettlau, por exemplo, um reconhecido historiador anarquista do começo do século 20, procura em suas análises uma determinada essência da anarquia desde a filosofia de Zenão, outros ainda veem no roubo do fogo por Prometeu (para dar aos homens) na mitologia grega como a primeira tendência de revolta “anarquista”. Nettlau (2008) assegura que as revoltas no passado e as filosofias antiautoritário, no entanto, não tinha a completa consciência da ideia anarquista, pois logo que conseguiam seus objetivos voltavam a impor novas ordens autoritárias para assegurar tais conquistas, por isso, foi somente no século 19 que a consciência de uma sociedade fundada sobre a base da anarquia se tornou clara na cabeça de alguns homens e movimentos sociais.
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